quarta-feira, maio 16, 2007

Jacques Chirac
Há dias, vi um documentário sobre a vida e a carreira política de Jacques Chirac. As características que mais se lhe apontam estavam todas lá: o oportunismo, o charme pessoal, o interesse pelas civilizações do médio-oriente, a mudança de convicções de uma década para a outra, a devoção ao Gaullismo. Além dos traços pessoais, tem ainda os comuns aos principais políticos franceses: décadas a andar na ribalta, com maior ou menor sucesso, e sucessivas tentativas de alcançar o mais alto cargo nacional.

O percurso político de Chirac já data dos anos sessenta. Começou no gabinete de Pompidou, do qual se tornou homem de confiança, tendo sido deputado, secretário de estado e ministro de várias pastas. Depois da morte do dinamizador do museu do Beaubourg, resolveu apoiar Valéry Giscard d ´Estaing nas presidenciais de 1974. Acabou por ser decisivo, e tal empenho valeu-lhe o cargo de primeiro-ministro, aos 42 anos. Mas a rivalidade entre os dois homens acabou por ditar a saída de Chirac, por "falta de condições", em 1976. Logo a seguir, fundou o RPR, o novo grande partido gaullista da direita francesa, aproveitando os movimentos já existentes no terreno, nomeadamente a UDR, candidatou-se à câmara de Paris e tornou-se o todo poderoso Maire da capital francesa, derrotando a candidatura suportada por Raymond Barre, seu sucessor na chefia do governo e homem de confiança de Giscard. Tentou sem êxito as presidenciais de 1981, ganhas por Miterrand, mas viria a ser de novo primeiro-ministro em 1986, impondo uma política de austeridade, em coabitação com o velho presidente socialista. Que o derrotaria de novo em 88. O maire de Paris, eurocéptico e soberanista, tornou-se um entusiasta da União Europeia no início dos anos noventa, mesmo a calhar para vencer à justa o referendo sobre o Tratado de Maastricht. Em 93, a RPR teve um êxito retumbante nas legislativas, e Balladur tornou-se chefe de governo. Dois anos depois, para as presidenciais, o RPR dividiu-se entre o primeiro-ministro (que teve o apoio de Sarkozy) e o Maire de Paris, que acabou por ganhar a contenda, ir à segunda volta conquistar o lugar que sempre ambicionara: a Presidência da França.

No primeiro mandato teve de suportar uma coabitação com Jospin e o conflito no Kosovo, e viu a França sagrar-se campeã mundial de futebol. No segundo, ganhou com mais de 80% dos votos contra Le Pen, foi mais atribulado: a crise no Iraque (que o tornou impopular a nível externo, mas que acabaria por lhe dar razão), apesar do apoio anterior à guerra no Afeganistão, a derrota do projecto da Constituição Europeia, a fundação da UMP, as diatribes com Sarko e o envolvimento nos casos de desvios de fundos entre a Mairie e o RPR.

É esta a longa carreira do homem que se despediu ontem da presidência, dando lugar a Sarkozy. "L ´escroc", para os inimigos, ou o homem que assumiu a liderança do mito gaullista e que estabeleceu laços entre o ocidente e a África e o Médio Oriente, para os admiradores. O seu principal legado terá mesmo sido esta influência francesa nesses territórios, e a sua larga popularidade, à qual potências como os EUA têm muitas vezes de recorrer. De negativo, fica como símbolo de uma classe política arrivista, burocrática, intriguista e de honestidade duvidosa, à qual se tenta pôr cobro no ciclo que agora se inicia.

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